Bajau: conheça o povo que evoluiu para passar mais tempo embaixo d’água

Pesquisa descobriu que etnia do sudeste asiático contou com a seleção natural para desenvolver habilidades de mergulho sobre-humanas

Bajau: conheça o povo que evoluiu para passar mais tempo embaixo d’água (Foto: hazize san/Wikimedia Commons)
Bajau: conheça o povo que evoluiu para passar mais tempo embaixo d’água. Acima: Crianças da etnia bajau na Malásia (Foto: hazize san/Wikimedia Commons)

Pessoas comuns conseguem segurar a respiração embaixo d’água por pouco mais de um minuto. Mas o mergulho livre, também chamado de mergulho em apneia, é uma habilidade que pode ser treinada, e inclusive é um esporte. O recorde mundial em apneia estática, em que o mergulhador apenas submerge sua cabeça dentro de uma piscina, é do espanhol Aleix Segura, de 36 anos. Em 2016, ele conseguiu ficar 24 minutos e 3,45 segundos submersso em uma piscina após inalar oxigênio puro.

A façanha de Segura foi possível após anos de experiência em mergulho livre, treinamentos e competições. Não se trata de uma capacidade inata, como a dos integrantes do povo Bajau, uma etnia com cerca de 1,1 milhão de pessoas residentes no sudeste da Ásia, em países como Filipinas, Malásia e Indonésia. Apelidados de “ciganos do mar”, os Bajau são conhecidos pela habilidade em mergulho livre que os tornam excelentes caçadores e coletores subaquáticos.

Dotados apenas de uma máscara de proteção e pesos para reduzir a flutuabilidade, os caçadores submarinos do povo Bajau chegam a enfrentar jornadas diárias de 8 horas, das quais 5 horas são passadas na água, em mergulhos que podem levar até 13 minutos, em profundidades abaixo de 70 metros.

O que acontece quando prendemos a respiração?
Nosso corpo reage imediatamente quando submergimos a cabeça na água e prendemos a respiração. Tudo para concentrar a circulação de sangue nos órgãos vitais. A frequência cardíaca diminui, os vasos sanguíneos das extremidades reduzem de tamanho e o baço se contrai.

baço é um órgão do sistema imunológico responsável por filtrar o sangue, reciclar glóbulos vermelhos danificados e produzir e armazenar glóbulos brancos. Quando ele se contrai durante a falta de ar, acaba liberando mais glóbulos vermelhos, fornecendo um suprimento extra de oxigênio para a corrente sanguínea.

Por ser um povo que habita as ilhas do sudeste asiático há centenas de anos, era de se esperar que a habilidade de mergulho dos Bajau tivesse sido adquirida por anos de prática como meio de subsistência. Mas o mistério intrigou cientistas das universidades de Copenhague (Dinamarca) e Berkeley (Califórnia, EUA), que decidiram ir a campo para descobrir o segredo por trás da habilidade.

Utilizando equipamentos de ultrassom portáteis, os cientistas mediram o tamanho do baço dos Bajau. E descobriram que, nesta população, o órgão chega a ser 50% maior do que em etnias vizinhas. A conclusão é de que um baço maior, quando contraído, libera mais glóbulos vermelhos para o sangue.

Apelidados de “ciganos do mar”, os Bajau são conhecidos pela habilidade em mergulho livre. Acima: povo em Bornéu (Foto: johnjodeery/Wikimedia Commons)
Apelidados de “ciganos do mar”, os Bajau são conhecidos pela habilidade em mergulho livre. Acima: povo em Bornéu (Foto: johnjodeery/Wikimedia Commons)

Herança genética
A princípio, a descoberta pode ser atribuída ao condicionamento físico dos mergulhadores. Porém, foi identificado que o tamanho do baço não variou entre indivíduos mergulhadores e não mergulhadores do povo Bajau. A questão teria uma explicação genética.

A segunda etapa do estudo incluiu uma análise genética do povo Bajau comparada com a de outras etnias asiáticas. A partir dela, os cientistas identificaram 25 mutações significativas no genoma dos Bajau. Uma delas é no gene PDE10A, associado ao tamanho do baço.

Com isso, a conclusão do estudo, publicado na revista científica inglesa Cell em 2018, é a de que a habilidade inata de mergulho livre do povo Bajau foi adquirida por meio de seleção natural. Além de ressaltar a capacidade humana de se adaptar geneticamente aos diversos ambientes, a pesquisa também pode ser usada para ajudar no desenvolvimento de tratamentos médicos envolvendo distúrbios como apneia do sono e hipóxia em altitude elevada.

FONTE: REVISTA GALILEU

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